quarta-feira, 8 de junho de 2011

Debate aponta impunidade como causa maior da violência no campo

 De Brasília
Márcia Xavie

A impunidade foi apontada como a principal causa da violência no campo. A conclusão é dos parlamentares e das lideranças camponesas que discutiram o assunto em Comissão Geral promovida pela Câmara dos Deputados na tarde/noite desta terça-feira (7). A deputada Manuela D'ávila (PCdoB-RS), presidente da Comissão de Direitos Humanos, elogiou as medidas adotadas pelo governo, mas cobrou ações permanentes.

Vemos que no decorrer das décadas não há conclusão das investigações, ou seja, há uma impunidade permanente. Não temos em nenhuma área, em nenhuma das demandas que cheguem ao Poder Judiciário, mesmo com todos os limites que esse poder tem uma capacidade de resolução tão baixa quanto os crimes que ocorrem no Norte do País relacionados aos conflitos agrários”, disse a parlamentar.
Ela sugeriu um diálogo com o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), “porque há flagrante omissão do Poder Judiciário no Norte do País”, avalia. E pediu a federalização de tais crimes, “já que na prática a impunidade é o que promove a continuidade das mortes”.

E cobrou do governo ações estruturantes e permanentes. “Respeito e acho que é salutar o plano chamado Operação em Defesa da Vida do Governo Federal, mas são ações imediatas”, disse, alertando que há necessidade de policiamento permanente e a estruturação do Instituo nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) na região.

Luta dos trabalhadores

Paulo Fonteles Filho, que falou em nome do PCdoB e representante do MST no Pará, destacou que “a paz na campo só virá quando o latifúndio estiver no lixo da história brasileiro. E para isso tem contado com a heroica, com a abnegada e com a corajosa luta dos trabalhadores rurais em nosso campo, que têm realizado um papel importante não apenas para projetar o Brasil para o futuro, mas também construindo esta própria realidade”.

Ele também atribui à impunidade a violência no campo. E apresentou os números que provam a situação. Nos últimos 20 anos, só no Estado do Pará, 700 trabalhadores, religiosos, advogados, políticos progressistas foram assassinados. Menos de 3% dos mandantes desses crimes foram levados a julgamento.

E citou o caso do assassinato de uma das mais importantes lideranças camponesas do sul do Pará, João Canuto de Oliveira, cujo inquérito policial demorou 18 anos para ser concluído. Segundo Paulo Fonteles, “o fato comprova que o aparato estatal, particularmente o do Estado do Pará, está ligado ao latifúndio, aos interesses do latifúndio”.

E acrescenta: “além de advogar para os interesses do latifúndio, procura criminalizar aqueles que lutam por um palmo de terra, aqueles que lutam para conquistar a terra e gerar alimento e riqueza não apenas para o campo, mas também para a cidade”.

Para ele, a solução para a impunidade seria a federalização dos crimes do latifúndio e a reforma agrária. E conclui sua fala declamando trecho do poema de Cecília Meireles: “Pelos caminhos do mundo/ nenhum destino se perde/ Há os grandes sonhos dos homens/ E a surda força dos vermes".

Operação em Defesa da Vida

A Comissão Geral, que durou cerca de quatro horas, levou três ministro à Câmara. Coube ao Ministro da Justiça, Eduardo Cardozo detalhar as medidas adotas pelo governo para combater a violência no campo que recrudesceu nas últimas semanas com assassinato de cinco trabalhadores.

Segundo ele, a Operação em Defesa da Vida, que está sendo implementada pelo governo federal naquela região, foi discutido pela Presidenta da República com os governadores de três Estados: Amazonas, Pará e Rondônia. Foi criado um grupo de trabalho, coordenado pelo Secretário-Geral da Presidência da República, Ministro Gilberto Carvalho, e composto pelo Ministro da Justiça, pela Ministra-Chefe da Secretaria de Direitos Humanos, pelo Ministro da Defesa Nelson Jobim e pelo Ministro Afonso Florence, que também participou do evento.

A Operação em Defesa da Vida consiste em dois tipos de medidas. A primeira é a presença física das Forças do Ministério da Justiça — Polícia Federal, Polícia Rodoviária Federal e a Força Nacional —, agindo de forma articulada, com o suporte logístico das Forças Armadas, concentrando-se naqueles locais em que existe uma situação de risco para as vidas, para evitar ocorrência de novos delitos.

Asegunda medida é garantir que o Poder Judiciário e o Ministério Público estejam presentes para superar a impunidade em relação a delitos nessa região. Muitos inquéritos decorrentes da prática de homicídios na região estão paralisados, admitiu o ministro, defendendo “investigações rápidas, profundas e punições exemplares”.

E anunciou que nesta quarta-feira (8), o Ministério da Justiça, a Secretaria Nacional de Direitos Humanos e o Ministério do Desenvolvimento Agrário, em conjunto com o Conselho Nacional de Justiça e o Conselho Nacional do Ministério Público farão uma visita a esses três Estados — Pará, Amazonas e Rondônia, onde se reunirão com os vários órgãos da Polícia para discussão da estratégia de segurança pública local. Também haverá reunião órgãos da Justiça para discussão da questão da investigação.

Ele disse ainda que há uma forte determinação da Presidência da República “para que se faça um bom plano e uma boa execução, para que desmandos e mortes como aquelas que ocorreram não mais se repitam”.

A ministra de Direitos Humanos, Maria do Rosário, também defendeu “a atuação do Poder Judiciário, do Ministério Público e das próprias polícias, no sentido de investigarem esses crimes e estabelecerem a comprovação dos seus autores para que eles não fiquem impunes”.

Problema antigo

Para o deputado Cláudio Puty (PT-PA), que propôs o debate, coincide com a dos demais oradores: “O primeiro passo é a ação policial e a presença da Polícia Federal para sinalizar que os assassinos não vão poder fazer o que querem. Mas, além das ações emergenciais, já determinadas pela presidenta Dilma, é necessário um segundo passo, que inclui a reestruturação das áreas protegidas, regularização fundiária das reservas extrativistas e alternativas econômicas para os assentamentos”, disse Puty.

A deputada Jandira Feghali (PCdoB-RJ) destacou a necessidade de recursos para as ações naquela área, apelando ao governo federal para que não haja contingenciamento de recursos.

Já o deputado João Ananias (PCdoB-CE) fez uma defesa emocionada da reforma agrária. “A luta pela reforma agrária não está fora de moda. Não é por meia dúzia falando mal de projeto de assentamentos que vamos baixar a guarda e desistir dessa luta histórica, que garante justiça social no campo”, disse, destacando que “a reforma agrária é para dividir melhor a terra e garantir a permanência nela do homem e da mulher para que possam, com dignidade e decência, criar sua família”.

E fez apelo à Presidente Dilma para que amplie e apresse os processos de reforma agrária. “Nós temos que fazer o nosso papel político, trabalhando para apressar a reforma agrária neste Brasil e produzir justiça no campo”, defendendo, assim como os demais oradores, “a punição dos bandidos que mandam matar trabalhadores”.
 
 

 

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